Me lembro que quando descobri que estava grávida o chão se abriu nos meus pés. Enterrei a cabeça e o corpo por umas duas semanas até poder respirar de novo. E depois respirei e respirei. Como a natureza é muito sábia, não me recordo mais de nada. Só sei que fiz tudo muito certinho. E então, quando ele nasceu, demorei outras duas semanas pra famosa ficha cair. Chamava ele de "bebê" e fiquei umas duas noites acordadas olhando pra ele como que querendo engolir, como que querendo viver aquilo. E disso ninguém fala. Ninguém te explica. Nem eu saberia explicar agora pra alguém. Mas, um belo dia incorporei. Depois disso, parei de simplesmente respirar e vivi. Olhei cada avanço daquele careca sem dente. Cheirei cada centímetro de orelha e no meio dos dedos dos pés. Me tornei uma leoa. E por mais que a vida desse rasteiras, lá estava eu com sorriso no rosto olhando cada passo, cada colherada, cada dente nascendo. E jurava que aquilo era ser mãe.
Não. Não. Ser mãe de verdade é não ter controle do cuidar.
Quando ele caiu e teve que ir para o hospital tomar pontos na boca eu fui a última a saber. Me ligaram dizendo: " Olha, mãezinha (odeio!), está tudo bem. Estamos esperando o cirurgião plástico". Disso eu me lembro. Meu chão não se abriu, ele simplesmente não existia. Como se eu não respirasse. Nem deu tempo de chorar. O instinto falou mais alto, atravessei a cidade e mataria qualquer um que estivesse no meu caminhou. Era uma mistura de desespero com a melhor plenitude de estar viva. Um nó sem fim. Me lembro que eu pensava: "PRECISO vê-lo". Cheguei em casa e tive o comportamento de uma psicopata. Olhei cada detalhe friamente, abracei aquele garoto com a boca inchada e alguns pontos. Contei cada dedo. Cheirei a orelha e depois de tê-lo em meu colo que desabei. Um choro angustiado. Um choro de revolta com a vida. Ali descobri que não posso nada.
Depois veio a cirurgia. Eu fiz tudo com a mesma alma psicopata. Levei no cirurgião pediatra. Briguei com o convênio como uma advogada. Expliquei pra ele como uma excelente professora. No dia, na sala (coisas de enfermeira que pode ficar), quando ele foi anestesiado, lá estava de novo aquela sensação. Lembro que quase desmaiei. Olhar ele "quase morto" me fez morrer junto. Saí imediatamente. E fiquei esperando do lado de fora roendo unhas. Ali descobri novamente que não poderia fazer nada.
E hoje, ele um cara querido, esperto e sorridente. Feliz. Veio a reunião da escola nova. Fui chamada de canto. "Mãezinha, precisamos conversar". Recebemos as avaliações. Ele é o pior da turma. O que tem mais dificuldade.
"Como?"- chão se abrindo.
"Ele tem não está atingindo o esperado para o bimestre".
Eu queria responder:
"Deixa ele. Ele é MEU FILHO, vocês não sabem de nada".
E mais uma vez veio aquela sensação de impotência perante a vida.
E foi então, depois de cinco anos que percebi.
Ser mãe é ser essa leoa. É cheirar a orelha em casa.
O que vem de fora e derruba o seu chão, não pode derrubar o dele.
Você está ali para abraçá-lo e dizer:
"Pronto. Eu estou aqui".
E a gente briga, luta, quer controlar a vida. Mas não consegue.
O segredo é criar da melhor maneira.
Cria-se pra vida. Tentamos o melhor.
E cheira orelha de filho. E torce pra que quando ela, a vida, chegar assim derrubando o chão dele. Você esteja lá dizendo:
"Pode derrubar. O chão dele é meu e a gente, junto, aguenta".
Feliz Dia das Mães!
E cheira orelha de filho. E torce pra que quando ela, a vida, chegar assim derrubando o chão dele. Você esteja lá dizendo:
"Pode derrubar. O chão dele é meu e a gente, junto, aguenta".
Feliz Dia das Mães!
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